O imunizante, desenvolvido pelo laboratório europeu Valneva em parceria com o Instituto Butantan, é o primeiro no mundo contra o patógeno
O Brasil vai iniciar os testes em humanos de uma vacina contra o vírus chikungunya nos próximos meses.
O imunizante, desenvolvido pelo laboratório europeu Valneva em parceria com o Instituto Butantan, é o primeiro no mundo contra o patógeno. Se aprovado, ele será a única forma de prevenir contra a doença, que pode provocar lesões na pele, dores nas articulações, imobilização e até morte.
Chamada de VLA1533-101, a vacina contém o vírus chikungunya modificado (atenuado) de forma a não ser capaz de infectar as células. Uma etapa anterior da pesquisa, conduzida nos Estados Unidos com 4.115 voluntários adultos, demonstrou que a vacina é segura e leva à produção de anticorpos em até 96% dos participantes.
Agora, o estudo de fase 3 no Brasil irá avaliar a segurança e a capacidade de produzir anticorpos da vacina em adolescentes que já tiveram a doença no passado e naqueles que nunca foram infectados.
Na etapa brasileira, serão incluídos somente adolescentes saudáveis de 12 a 17 anos. Os voluntários interessados em participar nos testes podem se cadastrar em um dos dez centros espalhados no país através do site do estudo do Butantan. A expectativa é que sejam incluídos 750 participantes.
Um dos centros que vão participar dos testes é a Unidade de Pesquisa do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, o único com abrangência na cidade de São Paulo e na Grande SP. Ligado ao estado, o centro teve também papel importante no ensaio clínico da vacina contra Coronavac, contra a Covid-19.
Para Ana Paula Veiga, médica infectologista e pesquisadora do Emílio Ribas, o teste em adolescentes no país é fundamental, pois pode levar à aprovação do imunizante pela Anvisa (Agênca Nacional de Vigilância Sanitária). “A etapa anterior já demonstrou que é uma vacina segura e imunogênica [que gera a produção de anticorpos], e estamos testando a mesma dosagem, mesma vacina que foi aplicada em adultos em adolescentes. O que se espera é que após os resultados e aprovação, essa vacina possa ser fabricada no Instituto Butantan”, diz.
A chikungunya é uma doença causada por um vírus transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, o mesmo relacionado a dengue, zika e febre amarela. Entre os sintomas estão febre alta, dores no corpo e na cabeça, manchas avermelhadas e dores nas articulações, que podem ser incapacitantes. Em pessoas com comorbidades, o quadro clínico pode ser ainda pior.
No país, no último ano, foram registrados 136 mil casos de chikungunya, com maior distribuição nos estados de Pernambuco (40.904), São Paulo (30.112) e Bahia (17.484). Este ano, nas sete primeiras semanas epidemiológicas, foram registrados cerca de 6.000 casos no país, uma redução de 16% em relação ao mesmo período do ano anterior, de acordo com o Ministério da Saúde.
O estudo da vacina vai contar com uma divisão de dois grupos, um recebendo o imunizante e o outro o placebo. Nem os participantes, pais ou responsáveis, nem os profissionais de saúde sabem quem recebeu qual substância (duplo-cego). Ao final do acompanhamento do estudo, que deve durar de seis meses a um ano, os participantes irão receber um comunicado de qual tipo de injeção receberam.
O próximo passo, descreve a pesquisadora, será a utilização da vacina em locais onde há alta circulação do vírus (ou seja, onde ele é endêmico) para avaliar a eficácia em vida real, e o Brasil é um desses países.
Segundo Veiga, os resultados obtidos até agora criam uma boa expectativa quanto ao que será observado também nos adolescentes. “Esperamos que seja uma vacina com uma produção duradoura de anticorpos, não temos ainda como saber qual vai ser a eficácia, mas se for semelhante ao que ocorre com a vacina da febre amarela, é provável que tenha uma proteção em dose única que dure até 10, 15 anos”, diz.