A depressão não é frescura e precisa ser encarada com seriedade
Classificada como um transtorno de humor, a depressão faz com que os pacientes tenham sentimentos de tristeza, perda ou raiva, que acabam interferindo nas suas atividades rotineiras.
Ao longo de décadas, as gerações aprendem a lidar e a se tratar de uma série de doenças e condições que, em tempos anteriores, não seria possível. Se atualmente temos sob controle doenças como poliomielite, rubéola, difteria, sarampo, febre amarela, entre outras, no passado, sem as vacinas, pessoas, principalmente crianças, morriam sem receber tratamento adequado.
Os distúrbios mentais fazem parte do rol de doenças que, nas gerações anteriores, eram silenciadas ou simplesmente as pessoas tratadas com procedimentos invasivos. A maioria das famílias preferia abandonar parentes que apresentassem qualquer tipo de desvio em relação aos padrões normativos da época, isso significava que muitos indivíduos eram internados de maneira compulsória e sem sequer ter alguma doença comprovada.
Os manicômios, como eram chamadas as instituições que recebiam pacientes descritos como “loucos”, aplicavam uma série de medidas que, na maioria das vezes, nem sequer ajudavam a tratar qualquer pessoa, eram apenas uma forma de manter as pessoas sob controle. Grande parte dos internos eram abandonados pelas famílias: mulheres casadas, cujos maridos não queriam mais; mulheres que não casaram e os pais não as queriam mais; homossexuais; moradores de rua; e qualquer outro tipo de comportamento considerado errado.
No Brasil, a luta antimanicomial teve início no fim da década de 1970, quando o psiquiatra italiano Franco Basaglia veio ao Brasil pela terceira vez para conferências e palestras. Enquanto frequentava as cidades, denunciando a atual situação psiquiátrica, ele tentava incentivar as pessoas a abandonarem os discursos e partir para a prática.
Tudo mudou quando Basaglia, que já tinha tido excelentes resultados com a reforma psiquiátrica na Itália em décadas anteriores, conheceu o Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena (MG), também chamado de Colônia ou Cidade dos Loucos. Horrorizado com a condição dos pacientes, ele afirmou, de acordo com artigo da Revista Lacuna, que o que tinha presenciado era “pior que um campo de concentração”.
Na mesma época, emergiram no país movimentos antimanicomiais, como o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM), criado em 1978, no Rio de Janeiro. Além de Basaglia, outras personalidades proeminentes na luta pela reforma psiquiátrica também vieram ao país, como Felix Guattari, Robert Castel e Erving Goffman. Já no fim da década de 1980, o movimento aderiu ao lema “por uma sociedade sem manicômios”.
Depois de importante articulação política, o Movimento de Luta Antimanicomial, que de acordo com Melluci pode ser visto como uma ação coletiva que busca romper todos os limites de “compatibilidade do sistema de saúde mental do país”, também à luz da Constituição Federal de 1988 e de importantes marcos para os direitos humanos, a Lei nº 10.216 foi promulgada em 2001.
Conhecida como Lei da Reforma Psiquiátrica, esse dispositivo estabelecia a progressiva substituição dos manicômios por uma complexa rede de serviços que colocam o cuidado em liberdade como um dos elementos fundamentais. Transformada em lei, a Reforma Psiquiátrica buscou orientar as instâncias do Poder Executivo a investirem na desinstitucionalização da psiquiatria.
Antes da Reforma Psiquiátrica, a depressão também era vista como um tipo de loucura, não apenas no Brasil, mas no mundo inteiro. O estigma da pessoa que aparenta ser saudável, mas enfrenta transtornos emocionais ainda existe, tangenciado pelo preconceito alimentado ao longo das décadas contra pessoas consideradas “abjetas” ou “desviantes”.
O padre Marcelo Rossi e o padre Fábio de Melo, duas figuras públicas cristãs brasileiras, já falaram abertamente em entrevistas e nas redes sociais sobre as próprias experiências com a depressão e a síndrome do pânico. A forma como enxergavam as doenças mentais mudou completamente quando sentiram na pele o que era.
Padre Marcelo, em sucessivas entrevistas, revelou que precisou lidar com a depressão e a anorexia. Mesmo tendo passado 19 anos, de acordo com ele, ajudando pessoas a sair de quadros depressivos, nunca acreditou que a doença fosse verdade, pensava que era frescura. Mas quando se viu enfrentando o sacerdócio como obrigação, foi quando a ficha caiu.
Em entrevista à Angélica, o padre Fábio de Melo contou um pouco como se sentiu quando descobriu que estava com depressão e síndrome do pânico. De acordo com ele, sempre teve a compreensão de que era capaz de consertar no outro tudo aquilo e em si mesmo, e que no momento em que não sabia mais como lidar com seus sentimentos e questões, enfrentou um período difícil.
O sacerdote também revelou que, em inúmeros momentos, pensou em tirar a própria vida e que a depressão o fazia nunca se sentir confortável dentro do próprio corpo, independentemente do lugar e das pessoas que estejam ao seu redor. Considerando extremamente complexo sair da depressão, ele reflete que acessar Deus quando não existe fé em si mesmo pode ser difícil.
Embora muitos indivíduos ainda acreditem que a depressão e outras condições mentais sejam “mera frescura”, o histórico de luta e os constantes depoimentos, inclusive de sacerdotes, sobre as doenças, fazem-nos ser mais cautelosos e respeitosos com cada processo. Afirmar que é apenas “falta de Deus” pode ser prejudicial a todos aqueles que enfrentam um verdadeiro calvário em busca de recuperação.
A depressão é uma doença, e caso conheça alguém que esteja passando por ela, é importante mostrar apoio e conversar sobre a possibilidade de buscar ajuda. Psicólogos e psiquiatras podem auxiliar nesse momento em que tudo parece não ter solução sem existir a necessidade de sofrer sozinho ou sozinha.
Depressão/Suicídio:
Se estiver passando por crises de depressão e precisar de ajuda, não hesite em discar 188. Este é o número da parceria do Centro de Valorização da Vida com o Ministério da Saúde. A ligação é gratuita.
Também é possível encontrar atendimento no endereço eletrônico: www.cvv.org.br para chat, Skype, e-mail e mais informações. Para contatar o Samu, disque 192. Atendimentos também são realizados nas Unidades de Pronto Atendimento (UPA), pronto-socorro e hospitais.