Acordos partidários ainda em andamento tentam consolidar nome alternativo. Pluralidade de candidatos pulveriza votos e dificulta desempenho
A um ano das eleições de 2022 (o primeiro turno está previsto para 2 de outubro), o cenário político do país está hoje marcado pela polarização entre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Para quem não se alinha com qualquer um dos dois, a estratégia consiste em fazer embalar uma candidatura autointitulada de terceira via. No entanto, nomes alternativos que façam sombra a Bolsonaro e Lula sofrem para conseguir decolar.
Enquanto o presidente sofre com a perda constante de popularidade, o petista acena para lideranças de centro a fim de angariar mais apoio e ampliar a vantagem que vem registrando nas pesquisas sobre o mandatário do país. Lula tenta unir centro e oposição contra Bolsonaro – e esvaziar de vez a chamada terceira via.
O atual chefe do Executivo nacional, por sua vez, espera reconquistar a direita e centro-direita com sua agenda econômica pautada nas reformas administrativa e tributária. Bolsonaro trabalha para ampliar apoio no Nordeste, busca implementar novo programa social que lhe permita retomar popularidade e tenta descolar sua imagem da má gestão frente à pandemia de Covid-19. A estratégia tem sido colocar a crise econômica na conta do isolamento social e no colo dos governos locais.
O temor de um potencial retorno de Lula ao Palácio do Planalto e a irritação de parte do eleitorado bolsonarista com o mandato do presidente são a esperança de nomes que tentam se viabilizar como alternativas à dupla. Hoje, de acordo com os levantamentos de intenção de voto, porém, nenhum tem se mostrado capaz de entusiasmar os “nem-nem” (nem Lula, nem Bolsonaro).
Segundo levantamento feito pelo Ipespe, o postulante alternativo a Lula e Bolsonaro com melhor desempenho nas pesquisas eleitorais é o ex-governador do Ceará Ciro Gomes (PDT). Sozinho, o pedetista concentra 11% das intenções de voto, seguido pelo governador de São Paulo, João Doria (PSDB), e pelo ex-ministro da Saúde de Bolsonaro Luiz Henrique Mandetta (DEM), com 5% e 4% do eleitorado, respectivamente. Os números consideram o desempenho dos presidenciáveis no primeiro turno.
Nem a vantagem de Ciro frente aos demais candidatos à terceira via o credencia, neste momento, como alternativa capaz de vencer Lula ou Bolsonaro. O petista alcança, segundo as pesquisas, 43% das intenções de voto, enquanto o atual presidente tem 28% do eleitorado a seu favor.
Assim, a mudança na polarização ainda não é cenário factível, conforme avalia o cientista político Pedro Abelin: “Não existe uma terceira via com base social capaz de ameaçar esse turno entre Bolsonaro e Lula. Toda hora surge algum nome, mas a verdade é que parece muito mais uma torcida do que uma análise crível da situação”, explica.
Com a indefinição de nome consolidado para a terceira via, o mandatário da República tenta aproveitar essa lacuna para conquistar antigos apoiadores. “Quando todos perceberem que a terceira via não existe de fato, Bolsonaro vai trabalhar para conquistar essa parte do eleitorado e capturar essa ideia do nome alternativo. Em grande parte de quem conclama essa terceira via, muitas dessas forças estiveram com Bolsonaro esse tempo inteiro e devem seguir o mesmo caminho no próximo ano. Hoje, essa tal terceira via, ainda assim, prefere Bolsonaro a Lula”, acredita.
O estrategista político Paulo Loiola crê que Bolsonaro tem chances de reverter a desvantagem em relação a Lula em eventual segundo turno. “O fato de Bolsonaro ter toda a máquina a seu dispor permite que ele tenha uma certa margem, mas vai depender muito da situação econômica e, principalmente, de como a narrativa bolsonarista sobre a situação econômica vai ser conduzida”, defende.
“Bolsonaro é muito hábil nesse processo de condução da narrativa. Ele tira notícias ruins da responsabilidade dele. A base consolidada dele tem toda uma tendência a ser mantida, e, com a melhoria da questão econômica, isso pode de fato virar a favor dele”, prosseguiu.
Para o marqueteiro político Victor Trujillo, a Lula caberá reverter a rejeição popular ao PT. “O Lula ajudou a eleger o Bolsonaro. Para o Lula, ter um Bolsonaro que fenece é melhor do que não ter Bolsonaro na disputa. O discurso dele não precisa desconstruir este Bolsonaro que se apresentou até aqui. Ele terá que cuidar dos problemas dele e da rejeição ao PT.”
Há otimismo entre os aliados da atual gestão pela recuperação da popularidade de Bolsonaro. O líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (PP-PR), aposta na retomada das atividades econômicas, em razão do avanço da vacinação do país como fator determinante para o crescimento do presidente nas pesquisas.
“As pesquisas refletem o momento, mas todas asseguram o presidente no segundo turno. Com a vacinação geral, teremos Natal, praia, Carnaval e futebol, acontecimentos que aquecem a economia e que asseguram a perspectiva de renda para os informais. O presidente Bolsonaro abrirá o período de convenções partidárias liderando a pesquisa”, promete o deputado federal.
O líder da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), por sua vez, crê que o atual presidente não conseguirá se reeleger. “Levando em consideração o desastre que tem sido a gestão de Bolsonaro e a contínua queda de sua aprovação e popularidade, acho pouco provável que ele seja reeleito no ano que vem. Bolsonaro será derrotado e terá que responder perante a Justiça por todos os crimes que cometeu enquanto esteve na Presidência da República”, enfatizou o parlamentar.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição no Senado, acredita que ainda há tempo para a formação de um novo nome. “Ainda é cedo. Tem espaço para surgirem nomes daqui até 2022. Eleição muda as coisas muito rapidamente. O que precisamos ter em mente é a necessidade de unificar o país”, ressaltou.
A partir deste sábado (2/10), não haverá mais possibilidade de mudanças na legislação eleitoral para o próximo pleito.
Em 2022, o país terá a primeira eleição geral a ser realizada sem coligações para cargos proporcionais. A alteração legislativa aprovada em 2017 prevê que a distribuição dos votos atribuídos a uma legenda seja calculada de maneira individual. Desta forma, partidos de menor expressão terão dificuldade para angariar vagas.
Outra novidade são os incentivos para que negros e mulheres assumam cargos eletivos, o que valerá até 2030. A proposta aprovada pelo Parlamento prevê, para cálculo da divisão dos fundos eleitorais e partidários, que votos nessas candidaturas sejam contabilizados em dobro.
As eleições de 2022 também marcarão a prática da criação de federações partidárias. Tal medida chegou a ser vetada por Bolsonaro, mas acabou validada após o Congresso Nacional derrubar o veto presidencial.
A nova regra permite que partidos pequenos evitem ser pegos em cheio pela chamada cláusula de barreira. Conhecido também como “patamar eleitoral”, o dispositivo restringe a atuação parlamentar de partidos que não atingirem percentual mínimo de votos. A legislação permite aos partidos reunidos em federação escaparem da perda da possibilidade de atuação no Congresso e de acesso a dinheiro do fundo eleitoral e a tempo de televisão.
Uma das maiores derrotas de Bolsonaro antes das eleições de 2022 foi não ter conseguido aprovar, no Congresso Nacional, a PEC do Voto Impresso. Sendo assim, ficou mantido o atual modelo de voto por meio da urna eletrônica. Sob alegação de que os equipamentos poderiam ser fraudados, o chefe do Executivo comprou imensa briga com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, e com o Supremo Tribunal Federal (STF).
O TSE assegura a lisura de todos os pleitos feitos pelo modelo do voto por urna eletrônica. Bolsonaro não conseguiu comprovar as supostas fraudes que denunciou, muito menos foi capaz de convencer o Parlamento a embarcar na ideia.
É unânime, porém, a cobrança por uma maior transparência do TSE sobre o funcionamento das eleições.
Em razão das críticas, a Corte decidiu pela criação da Comissão de Transparências das Eleições (CTE). O colegiado, instalado em 9 de setembro, centraliza as discussões sobre segurança e transparência do próximo pleito. O objetivo é aumentar a participação de especialistas, representantes da sociedade civil e instituições públicas na fiscalização e auditoria do processo eleitoral, contribuindo, assim, para resguardar a integridade das eleições.
Nesta segunda-feira (4/10), o tribunal abrirá códigos-fonte do sistema eletrônico de votação para conferência. O teste público de segurança do sistema eletrônico de votação, realizado pela Corte desde 2009, ocorrerá entre os dias 22 e 26 de novembro deste ano.
Durante o teste, participantes executam planos de ataque contra a urna eletrônica e, caso identifiquem alguma vulnerabilidade, informam diretamente ao tribunal. A partir disso, os sistemas são atualizados e novamente submetidos aos ataques dos investigadores.
“Esse procedimento é mais uma medida de transparência e de auditoria do sistema eletrônico de votação. É também uma garantia de que os hardwares e softwares chegarão ainda mais robustos à próxima eleição”, defende o TSE.
O cronograma do órgão também prevê a realização de audiências públicas para elaboração das resoluções que vigerão as próximas eleições. Primeiramente, serão feitos estudos pelo TSE e pelos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) para definição de requisitos e procedimentos relativos às eleições.
Depois, os estudos serão compilados e consolidados, dando origem às minutas de resoluções que, por sua vez, são levadas para discussão em audiências públicas com participantes de todas as esferas da sociedade. Superada essa etapa, as resoluções são levadas a plenário e, se aprovadas, viram normas a serem observadas por todos os envolvidos no processo eleitoral.