Pai da vítima, um adolescente de 14 anos, registrou boletim de ocorrência na tarde desta segunda-feira (20)
'Saudades de quando preto só era escravo': aluno é vítima de racismo em escola de Belo Horizonte — Foto: Redes sociais
"Espero que outras pessoas se encorajem. Isso (o racismo) não pode ficar mais escondido. Temos que denunciar! Não podemos nos omitir mais e temos que acabar com esse câncer chamado racismo, que assola a nossa sociedade".
A declaração foi feita pelo pai de um adolescente, de 14 anos, vítima de racismo em um grupo de mensagens criado por alunos do Colégio Cristão Ver localizado no bairro Jardim Vitória, na Região Nordeste de Belo Horizonte, onde a vítima estuda.
Os ataques racistas aconteceram na última quinta-feira (16). O homem registrou o boletim de ocorrência na tarde desta segunda-feira (20). (Veja nota da Polícia Civil abaixo)
"Saudades de quando preto era escravo" foi uma das frases ditas pelos jovens em um grupo de WhatsApp, criado para debater as provas on-line do colégio.
No entanto, o que seria mais uma ferramenta de trabalho, virou uma "terra sem lei", com xingamentos e ataques, depois que o adolescente decidiu sair do grupo.
Na última sexta-feira (17), o motorista de aplicativo disse que já havia se reunido com a direção do colégio e com os pais dos três alunos envolvidos, sendo um menino e duas meninas.
"A diretora disse que repudia todo o tipo de preconceito e racismo. Eles me atenderam e fizeram a reunião. Se depender da família, meu filho continua na escola. Porém, ele está muito abalado com tudo isso e não sei se vai completar o nono ano na escola", contou o pai do jovem. (Veja nota do colégio na íntegra no final desta reportagem).
"Meu filho já estava sendo ignorado, hostilizado pelos colegas. Foi só sair do grupo que os ataques aumentaram. Foi um baque pra mim, porque eles estudam juntos há sete anos", afirmou o pai da vítima.
"Que bom que o neguin não tá. Já não aguentava mais preto naquele grupo", disse uma das duas meninas que participaram dos ataques. "Coitado do neguin. Odeio ele, mas a gente tem que ser humilde", afirmou outra menina .
Segundo Gilberto Silva, advogado da família do adolescente, os pais dos estudantes podem ser responsabilizados, uma vez que não há como imputar o crime aos menores.
"Os pais podem ser responsabilizados na esfera civil com questões reparatórios tendo em vista que eles respondem pelos atos dos seus filhos, que estão sob a tutela deles", disse.
Ele ainda confirmou que iria acompanhar o pai da vítima até a delegacia para registrar ocorrência. "Quem vai definir se é crime de injúria racial ou racismo, que prevê até prisão, será a autoridade policial", disse Gilberto Silva.
Após a conclusão do inquérito, o caso será encaminhado para o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, que poderá ou não oferecer denúncia do caso.
Por meio de nota, a Polícia Civil de Minas Gerais informou que instaurou na tarde desta segunda-feira (20) um inquérito policial para investigar o caso. "Vítima e representante legal já foram ouvidos na presença do advogado na Delegacia Especializada de Apuração do Ato Infracional em Belo Horizonte", afirma. "Outras informações serão repassadas em momento oportuno para não prejudicar o andamento do feito", conclui a nota.
Leia a íntegra da nota do colégio:
"O Colégio VER, escola que tem no seu escopo pedagógico o ensino fundamental com diretriz Cristã, presidido por um Diretor negro e tendo seus corpos diretivo, docente e discente compostos por maioria negra e parda, vem a público manifestar o seu profundo repúdio frente aos atos de racismo sofrido por um aluno do 8º ano do ensino fundamental.
O ato de racismo sofrido pelo discente ocorreu em um grupo do aplicativo WhatsApp, sem qualquer participação ou conhecimento da instituição, onde foram proferidas palavras e expressões injuriosas em que a cor e a situação social foram vilipendiadas por outros adolescentes da mesma faixa etária.
O Colégio VER, enquanto uma instituição de Ensino, sempre atuou na busca pela igualdade, pela dignidade, pela cidadania e uma educação Cristã, objetivando a construção de uma sociedade justa e igualitária, alicerçada no principio do respeito e amor ao próximo, sendo este o verdadeiro proposito dos ensinamentos de Jesus Cristo, oportunidade esta que repudiamos veementemente todo e qualquer ato ou discriminação social e étnico-racial.
Com a indignação patente, a comunidade do Colégio VER manifesta sua irrestrita solidariedade ao aluno, a sua família e à toda sociedade que é ofendida com posicionamento discriminatório. Esperamos que as autoridades competentes apurem os fatos e responsabilizem os agressores, deixando claro que, como entidade educacional Cristã, que prega o amor, a solidariedade e o perdão, tal incumbência não é de nossa alçada.
Que Jesus Cristo e o Divino Espirito Santo iluminem as mentes de todos os envolvidos. Que os corações dos ofendidos sejam acalentados pelo amor do Pai e que o arrependimento sincero preencha os corações dos agressores. Que a Justiça dos homens e de Deus sejam derramadas em plenitude, punindo e, principalmente, evangelizando os pecadores".