A vítima estava no Rio para um curso, chegou ao estabelecimento passando mal, acompanhada de uma amiga
"Fiquei com medo dele voltar", disse uma mulher estuprada pelo funcionário de um hotel no Rio de Janeiro. (Foto: reprodução)
A hóspede vítima de estupro pelo funcionário de um hotel no Rio de Janeiro deu detalhes sobre o crime em uma entrevista ao “Encontro com Fátima Bernardes”. O caso aconteceu no último domingo, quando a mulher, que estava no Rio para um curso, chegou ao estabelecimento passando mal, acompanhada de uma amiga.
Segundo a moça, Fábio de Oliveira de Barros, que foi preso no dia seguinte, tentou impedir a colega de acompanhá-la até o quarto. Pouco depois, ele foi até o quarto uma primeira vez sob o pretexto de verificar seu estado de saúde.
“O professor nos liberou um pouco mais cedo, e aí nós fomos visitar ali a orla da Barra da Tijuca, éramos seis alunos. Mas eu passei um pouco mal e ela falou: ‘Vou te levar pro hotel. Você não tá bem’. Não tinha comido direito, tava passando mal do estômago, e aí ela me levou. E desde o primeiro momento esse rapaz não queria deixar ela subir comigo”, detalhou a moça, sob o pseudônimo Ana, dizendo que não chegou a ver o rosto do agressor, que falou apenas com sua colega.
“Ele ficou insistindo e tal, mas acabou que a gente subiu. Nisso que a gente subiu, entrou no quarto, ele logo em seguida bateu na porta, só que nesse momento eu tava no banheiro, tava vomitando, e aí não vi. Mas eu já tinha tirado a blusa e ele inclusive entrou essa hora no quarto e me viu daquele jeito. Ela (a amiga) abriu a porta e falou: ‘Olha, ela tá passando muito mal’. Porque ele bateu pra ela sair”, explicou a vítima.
Segundo ela, graças à pressão do funcionário, que falava em “problemas para o hotel” caso a amiga continuasse no quarto, a colega se despediu. Ana disse ter tranquilizado a moça afirmando que logo se deitaria para remediar o mal-estar.
Antes do crime, a amiga ainda voltou para buscar o carregador do celular que havia esquecido, acompanhada por uma camareira. Pouco depois, ela disse que alguém bateu na porta novamente, dessa vez com força, sem se identificar. Depois que Ana não respondeu ao chamado, o funcionário do hotel usou a chave mestra para entrar no quarto.
“Só ouvi o barulho do cartãozinho, abrindo a porta. Assim que ele entrou ele se identificou, mas de outra forma. Ele disse: ‘Olha, eu sou o motorista da sua amiga que tá lá embaixo e ela tá muito preocupada, então vim ver só se você tá bem’. Até aí eu não vi maldade, é um funcionário do hotel, né, eu não assimilei na hora, porque ele estava com o uniforme do hotel. Aí eu falei: ‘Não, tudo bem, pode ir’. Nesse momento eu já estava deitada sem roupa, de calcinha e sutiã, mas coberta com lençol”, contou a vítima.
Com a resposta, Fábio falou para a vítima que iria apenas desligar as luzes para deixá-la mais confortável para dormir. Foi quando o abuso aconteceu.
“Aí ele falou: ‘Então eu vou só desligar as luzes pra você dormir melhor’. Aí ele atravessou o quarto e desligou o abajur. Aí ele veio tocou no meu braço e perguntou: ‘Tá tudo bem mesmo?’. Eu não vi maldade. Só que aí foi rápido, ele passou a mão em mim, ele continuou falando pra me distrair, mas passou a mão nas minhas nádegas e nas minhas partes íntimas mesmo. Mas aí nesse momento eu virei e gritei pra ele sair, e ele saiu correndo”, detalhou.
Os momentos de entrada e saída do abusador foram capturados pelas câmeras de segurança do hotel. Segundo as imagens, o homem permaneceu quatro minutos no quarto da vítima. Elas ainda capturaram o momento em que Fábio, de 37 anos, saiu correndo do local.
Ana contou que em um primeiro momento ficou em “pânico” e não quis denunciar o estuprador, mas que o apoio da amiga que a acompanhava e dos policiais foram essenciais para ela mudar de ideia e tomar coragem para fazer o Boletim de Ocorrência.
“Logo que ele saiu eu fiquei em pânico, eu passei a noite inteira acordada vigiando a porta. Por que se ele é funcionário do hotel e tinha acesso ao quarto a hora que ele quisesse, ele poderia voltar. E eu fiquei com muito medo, porque eu pensei assim, dele pensar que eu tivesse visto o rosto dele, mas eu não vi, quem viu foi a minha amiga, eu não sabia o que fazer”, disse.
Apesar do medo, ela mandou mensagens para a amiga contando que o funcionário “havia passado a mão nela”. A moça visualizou a conversa apenas de manhã, mas na mesma hora disse ter “certeza” que era o mesmo homem que havia tentado impedi-la de acompanhar a vítima.
“Ela falou: Eu tô indo com a polícia aí. E até então eu não tinha saído do quarto. Eu só saí quando eles chegaram, quando a polícia chegou. Eu comecei a chorar, porque eu nunca tinha passado por uma situação dessa, eu tava completamente confusa e com medo, porque até então eu não tinha identificado o que aquilo significava. Por que a gente pensa que estupro é só realmente quando houve penetração. Aí o policial falou pra mim: Isso que você sofreu foi estupro. E eu fiquei muito confusa”, explicou.
“Foi fundamental a minha colega, porque ela tinha um histórico na família dela de estupro de vulnerável, então ela falou assim: ‘Você sofreu um abuso, você não pode não denunciar’. Então ela foi a pessoa que me incentivou, porque eu falei pra ela: ‘Amiga, eu só quero pegar as minhas coisas e ir embora daqui’, porque eu tava em pânico, mas aí os policiais também: ‘Não, vamos lá, vamos ver as câmeras’. Seguraram a minha mão e falaram: ‘Não desiste e vai até o fim'”, relembrou Ana.
A promotora Gabriela Manssur, convidada do “Encontro”, elogiou a postura da vítima e dos policiais que atenderam a ocorrência, e defendeu a desconstrução de conceitos errados sobre o que configura estupro.
“O estupro no Brasil ele não é só a conjunção carnal, a penetração. Ele é a conjunção carnal e qualquer outro ato sexual, ato libidinoso, como por exemplo passar a mão nas partes íntimas, a masturbação, o sexo oral, o sexo anal, contra a vontade da vítima para satisfação do prazer de outra pessoa”, explicou.
“Nós precisamos desmistificar essa questão que acha que estupro é apenas a introdução do pênis na vagina”, afirmou a promotora.
Fábio Oliveira de Barros foi preso no dia seguinte ao crime e não trabalha mais no hotel. Seus advogados, em um comunicado ao programa da TV Globo, afirmaram que a prisão foi “ilegal”, já que ele foi detido em casa no dia seguinte, o que não configuraria flagrante.
Apesar de ainda ter que enfrentar o julgamento, Ana se diz mais “aliviada” apesar de ainda “ter um pouco de pânico” e destacou a importância do apoio que recebeu.
“Fiquei muito aliviada e eu quero ressaltar que realmente o trabalho da polícia e da imprensa que estava lá ajudou muito”, completou.