Polícia Civil de Goiás investiga se ela ofendeu os autistas, as causas LGBTQIA+ e obesos
O delegado Manoel Vanderic, da Delegacia de Atendimento à Pessoa com Deficiência de Anápolis, ouviu nesta semana relatos de pais sobre as constantes discriminações sofridas contra filhos com autismo. Esses testemunhos fazem parte do inquérito que investiga as falas da influenciadora digital da cidade Larissa Rosa, que zombou de vagas reservadas para autistas ao visitar um shopping de Goiânia.
"Como não é uma deficiência visível, a maioria [sociedade] interpreta as características dos autistas como birra, má-criação e falta de pulso dos pais. Como não se vê, relativiza-se a gravidade que as famílias enfrentam", explicou Vanderic.
Os comentários da influencer e da mãe dela, Vânia Rosa, foram postados em um grupo de amigos próximos na terça-feira (14), que teria apenas 18 pessoas, segundo a própria Larissa, mas mesmo assim o vídeo vazou e ganhou força na internet. Depois, ela e a mãe postaram vídeos pedindo desculpas (leia a íntegra ao final do texto).
A Polícia Civil recebeu cinco denúncias contra a influenciadora. Em uma das denúncias, O delegado Joaquim Adorno recebeu a ligação de um pai de criança autista chorando, indignado com a situação, e cobrando investigação. A influencer e a mãe dela serão ouvidas na próxima semana.
Pessoas autistas têm direito a vagas preferenciais em estacionamentos de todo o país, depois que a nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012, definiu o autismo como uma deficiência. Só é preciso fazer uma credencial para conseguir o direito.
A mãe da influencer estava ao lado dela durante a gravação dos vídeos. No início, ela repreende os comentários da filha. "Você não vai fazer isso. Qual é o problema do autista?", questiona. A filha, então, respondeu:
“Vou sim. Não tenho nenhum problema com autista. A vaga é tão colorida que achei que era para viado. Vaga para mim nunca tem”, disse a maquiadora.
No início de uma sequência de vídeos, Larissa Rocha também questiona quando seria liberada uma vaga para "gordo estressado".
“Gente, olha isso aqui. Agora tem vaga exclusiva para autista. Cara, o mundo está muito difícil. Quero saber quando vai ter vaga para gordo estressado”, diz Larissa rindo das vagas.
Entidades e especialistas repudiaram os vídeos da influenciadora digital Larissa Rocha. A escritora Fatima de Kwant, que tem livros publicados sobre o tema e é mãe de autista, disse em sua rede social que as comunidades não perdoam o capacitismo.
"Sabemos que muita gente não gosta da gente, se incomodam com nossa luta, e mais ainda com nossas (pequeníssimas) vitórias. Desde que não incomode o conforto delas, a inclusão é legal", escreveu Fatima em sua rede social.
A diretora da Associação de Pais de Autistas e Deficientes de Goiás, Janaína Athayde, disse que foi difícil assistir o vídeo e até para se posicionar sobre o caso e disse que o vídeo é sobre “ódio e intolerância".
O presidente do Núcleo de Apoio e Inclusão do Autista (NAIA), Marcelo Oliveira, disse que esse tipo de declaração passa longe de ser uma piada. A entidade atende cerca de 60 pessoas com autismo em Goiânia.
Já a neuropediatra Angélica Ávila escreveu uma nota, onde disse que não pode deixar de manifestar sua revolta quando assiste cenas semelhantes, apesar de ser extremamente triste, desanimador e frustrante.
"Dói ver um direito conquistado com tanta luta ser motivo de chacota de uma forma tão ignorante e prestando um grande desserviço. É aí que vemos quanto preconceito, capacitismo e falta de informação existe em nossa sociedade", desabafou a médica.
Decidi vir, através dessa nota, pedir as mais sinceras desculpas pelos acontecimentos que estão repercutindo nas últimas horas. Me desesperei inicialmente com a repercussão da situação e com um bombardeio de mensagens revoltadas (com razão).
Agora, entendo que a forma que me senti com esse turbilhão ainda não chega perto do que muitas mães e outros grupos sentiram ao ouvir as palavras infelizes que pronunciei.
Refleti sobre toda a situação e quero me desculpar também por dizer que se tratou de uma brincadeira, feita exclusivamente em um grupo de melhores amigos com 18 pessoas. Isso também não justifica.
Minhas palavras não podem ser vistas como brincadeira e não deveriam ter sido ditas nem para mim mesma, imagine para um grupo de 18 pessoas. Acreditem, elas não me representam em nada.
Agradeço também às pessoas que, apesar de reprovarem a conduta e não terem nenhuma obrigação de me ensinarem nada, ainda tiraram um minuto do tempo delas para me enviar informações e materiais que me mostraram realidades diferentes das que eu já conheci.
Espero que essa infeliz situação um dia possa ser perdoada por quem se sentiu ofendido. Garanto também que, da minha parte, nunca mais vai se repetir.
Assim como anunciado ontem, permaneço à disposição no direct para me desculpar individualmente com quem estiver decepcionado e revoltado com minha atitude.