Julgamento da prisão em segunda instância é suspenso com quatro a favor e três contra, mas posição dos outros ministros aponta uma provável mudança do entendimento atual
Primeira a ler o voto no segundo dia da análise, ministra acompanhou o relator e se posicionou pela prisão após (foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/ABR)trânsito em todas as instâncias
Primeiro a ser pronunciado na sessão dessa quinta-feira, o voto da ministra Rosa Weber, considerado decisivo, foi contrário a aplicação da prisão em segunda instância antes do esgotamento de todos os recursos.
Ela acompanhou o ministro-relator Marco Aurélio Mello ao entender que a prisão só deve ocorrer após a sentença condenatória ter transitado em julgado e indica que a Corte deve se posicionar para rever o posicionamento que prevalecia até então.
Quatro dos 11 magistrados ainda precisam votar. Entre eles, estão Gilmar Mendes, Celso de Mello e o presidente do Tribunal, Dias Toffoli. Até o momento, o trio tem sido contrário a execução da pena na segunda instância. Além do trio, falta votar a ministra Cármen Lúcia, favorável à antecipação da pena.
Se esta tendência for confirmada, seriam seis votos a favor da revisão do entendimento da corte, formando maioria, o que pode liberar, para responder em liberdade, pelo menos 4.895 presos em todo o país, incluindo 38 detentos da Lava-Jato, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Outra possibilidade, considerada como uma espécie de terceira opção e que pode ser proposta pelo ministro Dias Toffoli é que a prisão só ocorra a partir da manutenção da sentença condenatória no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Dessa forma, é criada uma execução provisória após a terceira instância, deixando nas mãos do STF a última possibilidade de absolvição.
Prevalecendo a terceira via, Lula não seria beneficiado, pois já foi condenado também no STJ.Ao ser abordado por jornalistas, no fim da sessão, Toffoli informou que o julgamento deve continuar no começo de novembro, pois na semana que vem não haverá sessões plenárias no Supremo.O ministro declarou que ainda não formulou seu voto e que está aberto aos argumentos dos demais integrantes da corte. “A princípio será 6 ou 7 de novembro (a retomada do julgamento).
Estou pensando o meu voto. Estou aberto a ouvir todos os debates. Meu voto não é um voto de bancada. Ele também tem o cargo da representação do Tribunal como um todo”, disse.Votos“Não é dado ao intérprete ler o preceito constitucional pela metade, como se tivesse apenas o princípio genérico da presunção da inocência, ignorando a regra que nele se contém – até o trânsito em julgado”, afirmou a ministra Rosa Weber. Ao ler seu voto, ela afastou o argumento de que tenha se posicionado de forma dúbia ao longo dos julgamentos em que teve que se votar sobre o tema.Segundo ela, no episódio em que analisou o habeas corpus do ex-presidente Lula, ela optou pela garantia da segurança jurídica.
Dessa forma, manteve o entendimento que vinha sendo adotado pela Corte desde 2016, argumentando que caberia ao plenário se debruçar novamente sobre o assunto. “Minha leitura constitucional sempre foi e continua a ser exatamente a mesma”, disse, ao fundamentar seu posicionamento.Com voto longo, a ministra chegou a ser interrompida pelo presidente do Supremo para pedir que adiantasse a conclusão, na expectativa de que fosse possível terminar ainda ontem o julgamento. Contudo, Rosa contra argumentou dizendo que é necessário deixar as ideias transparentes.
“Se se corre muito talvez fique até inteligível, por isso depois se tenha dificuldade de entendê-lo”, afirmou.
Já o ministro Luiz Fux votou a favor da possibilidade de prisão após condenação em segunda instância. Para Fux, não há motivos que justifiquem uma alteração do atual entendimento da Corte, que permite a execução antecipada da pena – medida considerada um dos pilares da Operação Lava-Jato no combate à impunidade. “Por que nós vamos mudar agora a jurisprudência? Qual vai ser o benefício? O direito vive para o homem, e não o homem para o direito”, disse Fux, que defendeu a jurisprudência da Corte, em vigor desde 2016.Em seu voto,
Ricardo Lewandowski, último a votar na sessão, disse que a Constituição estabeleceu como cláusula pétrea que a prisão para cumprimento de condenação somente pode ocorrer após o trânsito em julgado do processo, ou seja, fim de todos os recursos nos tribunais superiores. “A jurisprudência desse Tribunal consolidou-se, salvo um lapso de tempo, que ofende o princípio da presunção da inocência a execução da pena de liberdade antes do trânsito em julgado da sentença”, afirmou.
Placar
Até o momento, além de Rosa, Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski votaram para mudar o atual entendimento da Corte, que permite a execução antecipada da pena. A medida é considerada um dos pilares da Operação Lava-Jato e um dos instrumentos que incentivou acordos de colaboração premiada.É esperado que integrem essa mesma corrente os ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello, totalizando cinco votos. No outro lado, os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux votaram favoráveis a possibilidade de prisão após condenação em segundo grau.
O voto da ministra Cármen Lúcia deve ir no mesmo sentido.O entendimento atual do Supremo é que permite a prisão após a condenação em segunda instância, mesmo que ainda caiba recurso. Mas, para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o entendimento é inconstitucional. A entidade é uma das autoras das três ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs), que levaram ao atual julgamento.
Palavra de especialista
Leonardo Pantaleão advogado criminalista e professor de direito penal e processual da Universidade Paulista
Ministros podem mudar parecer
“Enquanto não acabar o julgamento, os ministros podem até rever seu voto. Não há restrição para que seja apresentada a tese de prisão apenas depois do julgamento no STJ. Se esse posicionamento surgir, o ministro Dias Toffoli vai colher o parecer dos seus pares a respeito da ideia, e eles podem acatar ou não. Entendo que essa é uma alternativa que busca um meio termo, mas no meu posicionamento não tem espaço. Ou o Supremo Tribunal Federal entende que a execução provisória é constitucional ou que não é.
Os que sustentam a inconstitucionalidade da execução provisória da pena vão manter o posicionamento de que não pode executar até o trânsito em julgado. Se essa tese (STJ) não for atingida e ele (Dias Toffoli) entender que a prisão em segunda instância é prematura, provavelmente vai optar pela inconstitucionalidade. Essa vai ser uma expectativa muito grande.”Comemoração
O presidente nacional da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim), Elias Mattar Assad, e outros advogados que assistiam à sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) celebraram ontem o voto da ministra Rosa Weber. Após o voto dela, a Abracrim publicou uma foto no Facebook da instituição em que advogados aparecem de mãos dadas no plenário do STF, com a legenda “E viva a Rosa! A Rosa”, uma referência à canção A rosa. “Uma aula", destacou o presidente da Abracrim.
O Estado de Minas