A troca dos comando das forças de segurança acabaram levantando também a politização nos quartéis
A crise causada por Jair Bolsonaro com as Forças Armadas repercutiu nas polícias militares brasileiras e aumentou a “inquietude e politização” nos batalhões. Outros dois episódios apoiados por bolsonaristas —o caso de um soldado da PM baiana e a defesa pelo PSL de projeto de lei que amplia controle do governo federal sobre as polícias — também miraram nesta semana a base policial.
No entanto, a avaliação de coronéis policiais militares da reserva e da ativa das PMs de São Paulo, Minas Gerais, Santa Catarina, Alagoas e Bahia é de que vozes que sustentam a insurgência policial contra governadores em apoio ao presidente da República não encontram eco nas tropas. Apesar do apoio de PMs a Bolsonaro, os oficiais não veem risco de um golpe contra governadores.
Na opinião dos PMs ouvidos, as demissões dos comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica foram recebidas com “surpresa” e “preocupação”.
“Uma renúncia coletiva com certeza é um ato de desagravo ao comandante supremo das forças. Mas, com certeza: isso [tentativa de golpe de PMs contra governadores] é devaneio e teoria da conspiração”, disse o coronel Elias Miler, presidente da Defenda PM, associação de oficiais da Polícia Militar paulista.
“É uma crise que não foi feita por nós e que não queremos participar. A nossa relação com as Forças Armadas é muito formal, obedece à cadeia de comando militar”, acrescentou o presidente da Federação Nacional de Entidades de Oficiais Militares Estaduais, coronel Marlon Jorge Teza.
Os coronéis dizem que, apesar do amplo apoio de Bolsonaro nas PMs, apenas uma pequena parte desse contingente é “apaixonada pelo bolsonarismo” ao ponto de defender a ideia de um golpe contra governadores em razão de decretos de isolamento social na pandemia.
“Essas vozes que apoiam o presidente irrestritamente, que são apaixonados, não têm eco. Não há movimento de golpe. Não há conspiração. Eu tenho dito: em que pese esses fatos isolados, como aconteceu na Bahia, as polícias militares sempre cumpriram e vão cumprir a lei, a Constituição”, diz Marlon Jorge Teza.
Boatos sobre uma suposta insurgência de PMs começaram após o episódio do policial baiano que, em surto psicótico, disparou a esmo contra guarnições da PM. Ele foi baleado e morto por um colega de farda.
No dia seguinte, a deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), presidente da CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania), usou o caso para incitar a PM da Bahia contra o governador Rui Costa (PT). Ela apagou o tuíte e disse que prefere “aguardar os rumos da investigação”.
As PMs brasileiras são suporte do governo Bolsonaro, que com frequência participa de cerimônias de formatura da classe por todo país.
Segundo projeções da Feneme (Federação Nacional de Entidades de Oficiais Militares Estaduais), os PMs conseguiram alavancar cerca de 14 milhões de votos para Bolsonaro em 2018. A parcela mais alinhada ao presidente pertence, na maioria dos estados, aos praças —agentes de baixa patente, como soldados, cabos, sargentos e subtenentes.
Para o tenente-coronel Olegário Marques Paes Júnior, de Alagoas, manifestações antidemocráticas são “casos isolados” nas corporações.
Essas manifestações de insurgência são pontos isolados. Nós, de fato, temos uma torrente ainda muito apaixonada ao bolsonarismo, mas na sua maioria não conseguem contaminar o pensamento da corporação a esse ponto. É simples: seguimos a lei”, afirma o tenente-coronel da PM Olegário Marques Paes Júnior.
Ele ainda diz que há um desconforto crescente das tropas com os governos estaduais, mas que também há insatisfação com o governo Bolsonaro.
“Estamos vivendo um movimento de inquietude com governos estaduais e com o governo federal. Com governo estadual é permanente, sempre houve. Mas o governo federal, nós apostamos muito e até agora chegou muito pouco como foi prometido, em termos de legislação. Isso está deixando as PMs mais inquietas. A politização dos militares nunca esteve tão grande”, disse.
O presidente da Associação dos Oficiais Força Invicta da Bahia, major Copérnico Mota, reforçou que o imbróglio das Forças Armadas não pautou os batalhões daquele estado. “Na Bahia, estamos passando por um turbilhão. Por aqui só se fala da morte do nosso soldado”, disse.
Mota disse que os PMs não discutem uma insurgência contra o governador. “Essa relação não existe. Uma falta dessa natureza, um acontecimento lamentável, só se fala no luto e no respeito ao falecido.”