Bolsonaro foi condenado a 27 anos e três meses de pena prisão em regime inicial fechado. Ele é o primeiro ex-presidente a ser condenado por tentativa de golpe de Estado
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro e mais sete réus por tentativa por golpe de Estado. Eles integram o Núcleo 1 da tentativa de golpe, conforme a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR). Bolsonaro foi condenado a 27 anos e três meses de pena prisão em regime inicial fechado.
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro e mais sete réus por tentativa por golpe de Estado. Eles integram o Núcleo 1 da tentativa de golpe, conforme a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR). Bolsonaro foi condenado a 27 anos e três meses de pena prisão em regime inicial fechado.
No entanto, mesmo após a condenação, Bolsonaro não deve ser preso imediatamente. Antes, o acórdão da decisão deve ser publicado — processo que pode ocorrer em até 60 dias após o julgamento. O Correio ouviu advogados que detalham os próximos passos no processo que condenou Bolsonaro e mais sete réus.
O advogado Antônio Lázaro Neto explica que o acórdão reúne todos os votos dos ministros e serve como base para os recursos dos advogados de defesa. As defesas dos réus terão dois dias para apresentarem os recursos contra as condenações.
Sendo assim, a pena só deve ser executada após o esgotamento dos recursos e quando a decisão tornar-se definitiva, o chamado trânsito em julgado. "Nesse momento, o recurso cabível e que naturalmente será apresentado se chama embargos de declaração. Esse recurso é cabível quando houver no acórdão que vai ser publicado alguma obscuridade, dúvida, contradição ou omissão que a defesa identifique e pretende que o tribunal se manifeste", detalha Lázaro Neto.
Guilherme Barcelos, advogado e doutor em direito constitucional, ressalta que há uma discussão acerca do cabimento ou não dos chamados embargos infringentes, considerando as divergências apresentadas pelo ministro Luiz Fux.
"A legislação prevê o cabimento de Embargos Infringentes quando um julgamento dessa natureza, em competência originária do STF, não tiver sido unânime. Vejam bem: a legislação não estabelece o número de votos divergentes, se limitando a afirmar a existência de divergência, em si, que poderia ser a partir de um voto só. Essa é a disposição legal. Porém, o STF, é preciso reconhecer, já estabeleceu, ainda que noutra composição, que o cabimento de Embargos Infringentes só estaria posto com a existência de quatro votos divergentes, em sede de julgamento por meio do Plenário, e com a existência de dois votos divergentes, em sede de julgamento por meio de uma das Turmas", afirma Guilherme.
O advogado Antônio Lázaro Neto destaca que é difícil prever quando Bolsonaro será preso, pois não se sabe quanto tempo vai levar para a publicação do acórdão. Além disso, ainda haverá a discussão dos embargos de declaração. "Depois do julgamento desses embargos, o acórdão dos embargos pode também ensejar novos embargos de declaração. Existem alguns prazos que ficam difíceis de medir. Porém, considerando como esse processo caminhou no STF durante todo esse tempo, imagino que não leve não vai levar muito tempo. Nós estamos agora no mês nove, final do ano ou começo do ano que vem já podemos pensar na execução dessa pena", avalia o advogado.
Sobre quanto tempo Bolsonaro deve cumprir a pena em regime fechado, Antônio cita que, em tese, teria que cumprir 16% dessa pena. Entretanto, há a possibilidade da remissão pelos dias trabalhados, pelas horas estudadas ou pela leitura de livros. "Se ao longo do cumprimento dessa pena ele trabalhar, estudar, ler, pode antecipar a progressão do regime fechado para o semi-aberto", frisa.
Em relação ao local de cumprimento da pena, em regra, é o Complexo Penitenciário da Papuda para quem cumpre a pena no regime fechado. Porém, tratando-se de um ex-presidente, pode ser destacado um outro local para assegurar a integridade física dele e também garantir a organização e a segurança do sistema prisional.
"Então, pode-se colocar ele para cumprir essa pena, por exemplo, na Polícia Federal. No caso do Bolsonaro, há uma questão de saúde e de idade que pode, após o trânsito em julgado da pena, ser pedido pelos advogados que ele cumpra prisão domiciliar. Isso é normal, está dentro da lei", aponta Antônio.
Com exceção de Alexandre Ramagem, os demais sete réus foram condenados pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. No caso de Ramagem, a parte relativa a fatos ocorridos após sua diplomação como deputado federal, em dezembro de 2022 (dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado), está suspensa até o término do mandato.
Por quatro votos, a Primeira Turma decidiu pela perda do mandato de deputado federal de Alexandre Ramagem e pela inelegibilidade de todos os réus por oito anos após o cumprimento da pena.
Em relação a Alexandre Ramagem e Anderson Torres, a Turma determinou a perda do cargo de delegado de Polícia Federal.
Para Jair Bolsonaro, Augusto Heleno, Paulo Sérgio e Almir Garnier, a Turma determinou, por unanimidade, que o Superior Tribunal Militar (STM) seja oficiado para analisar a Declaração de Indignidade para o Oficialato, que pode levar à perda de posto e patente militar. Este ponto não atinge Mauro Cid, já que ele teve uma pena inferior a dois anos. A comunicação deverá ser feita após o encerramento da ação e o esgotamento de todos os recursos.
Também foram estabelecidas multas para sete dos réus. Todos também foram condenados a pagar, de forma solidária, uma indenização de R$ 30 milhões por danos morais coletivos. O valor foi imposto a todos os condenados por envolvimento nos atos de 8 de janeiro de 2023.
O advogado Melìllo do Nàscimento avalia que dada à dimensão histórica do julgamento, haverá consequências nas áreas jurídicas, políticas, eleitorais, diplomáticas e sociais.
"No mundo do STF, haverá recursos e a tentativa de levar o assunto para o plenário do Supremo. O voto do ministro Luiz Fux servirá de base, inclusive em tribunais internacionais. Na política, a pressão no Congresso em torno do projeto da anistia aumentará, o fim do foro privilegiado ganhará maior força e o impeachment do ministro Alexandre de Moraes, especialmente, voltará ao debate parlamentar. A oposição, após a definição da situação do ex-presidente Jair Bolsonaro, cuidará da disputa pelo seu espólio de votos, ao mesmo tempo que estará se equilibrando para não se afastar dos eleitores mais moderados e dos aliados de centro. No campo das relações internacionais, a relação entre Brasil e Estados Unidos deve ter mais tensão", elenca Melìllo.
O advogado chama atenção para o fato de que o que impede que o autoritarismo vença a democracia é o conjunto das instituições republicanas. "Elas funcionam como um muro de contenção, como barreiras que impedem que os projetos autoritários avancem sobre a teia das relações sociais", cita.
"O STF, nos últimos anos, tem sido submetido às mais diversas situações que desafiam a tradição. Basta pensar no ineditismo das ações penais a ele submetidas. Mudanças de forma, como o debate no Plenário, ao invés da turma pudessem reduzir as críticas. Nada, porém, pode retirar a legitimidade da instituição do STF, que, mesmo com as posições divergentes, evidencia que não há outro espaço que não seja institucional para enfrentar as mais inusitadas situações, em uma conjuntura mundial em que há um crescimento exponencial de tentativas de reduzir o espaço plural da democracia", finaliza Melìllo.
Danilo Porfirio, professor e pós-doutor em relações internacionais pelo Instituto Santiago Dantas, pontua que existe a possibilidade, conforme o observado do histórico do governo Trump, de se aplicar novas medidas retaliatórias ao Brasil nas áreas da economia.
O especialista também citou que, com a condenação de Bolsonaro, o Brasil mostra que foram respeitados o Estado Democrático de Direito, os poderes, o devido o processo legal, a ampla defesa e o contraditório".
Nauê Bernardo, cientista político e professor de direito do Ceub, lembrou da movimentação dos parlamentares da oposição pela anistia dos envolvidos nos ataques de 8 de janeiro de 2023, incluindo Bolsonaro.
O especialista pontua: "A anistia hoje conta com antipatia de parcela relevante da população e apoio de outra parcela relevante da população. Por isso, a avaliação de força ou fraqueza da discussão tem ligações com a decisão do STF, mas o verdadeiro cálculo a ser feito pelos parlamentares é eleitoral. A tomada de decisão vai depender do quão bem ou mal essa pauta cair nas bases de votos".